Personagens: Jerônimo

Quanto mais eu avanço na leitura, mais fica evidente para mim que eu estava enganada: o personagem João Romão não é o protagonista do livro. Nem o Miranda, nem a Rita Baiana, e nem o Jerônimo, de quem falaremos hoje.

O protagonista de O Cortiço é o PRÓPRIO cortiço. Entender essa ideia é muito importante para sacar o “espírito” da literatura naturalista, que defende a tese de que, assim como acontece nas ciências naturais, o meio determina o comportamento da sociedade.

É um fenômeno muito visível no personagem Jerônimo, um português muito sério e trabalhador que, depois de se mudar para o cortiço, passa por uma verdadeira metamorfose.

Procurando pelo Google Images, eu não encontrei nenhuma ilustração do Jerônimo que me satisfizesse. Então resolvi usar a foto de como o vejo na minha imaginação: como o ator Paulo Rocha, o português bonitão da novela Fina Estampa (é, eu já tinha comentado aqui o meu fraco por novelas… eu não estava brincando não!).

No início da história, Jerônimo é descrito como um exemplo de seriedade e virtude. Dedicado e batalhador, ele tinha se mudado de Portugal para o Brasil com a esposa Piedade para fazer fortuna e retornar à terra. Logo ganhou a confiança do João Romão como administrador da pedreira.

“Jerônimo acordava todos os dias às quatro horas da manhã (…); e, em mangas de camisa de riscado, a cabeça ao vento, os grossos pés sem meias metidos em um formidável par de chinelos de couro cru, seguia para a pedreira.

A sua picareta era para os companheiros o toque de reunir. Aquela ferramenta movida por um pulso de Hércules valia bem os clarins de um regimento tocando alvorada. Ao seu retinir vibrante surgiam do caos opalino das neblinas vultos cor de cinza, que lá iam, como sombras, galgando a montanha, para cavar na pedra o pão nosso de cada dia. E, quando o sol desfechava sobre o píncaro da rocha os seus primeiros raios, já encontrava de pé, a bater-se contra o gigante de granito, aquele mísero grupo de obscuros batalhadores.”

O Cortiço, pág. 53 (ed. Moderna)

Ao cabo de poucos meses, porém, a vida num cortiço brasileiro (e os encantos de Rita Baiana, por quem se apaixona) produzem enorme influência nos modos do sério e trabalhador Jerônimo. Acompanhem:

“Uma transformação, lenta e profunda, operava-se nele, dia a dia, hora a hora, reviscerando-lhe o corpo e alando-lhe os sentidos, num trabalho misterioso e surdo de crisálida. A sua energia afrouxava lentamente: fazia-se contemplativo e amoroso. A vida americana e a natureza do Brasil patenteavam-lhe agora aspectos imprevistos e sedutores que o comoviam; esquecia-se dos seus primitivos sonhos de ambição; para idealizar felicidades novas, picantes e violentas; tornava-se liberal, imprevidente e franco, mais amigo de gastar que de guardar; adquiria desejos, tomava gosto aos prazeres, e volvia-se preguiçoso resignando-se, vencido, às imposições do sol e do calor, muralha de fogo com que o espírito eternamente revoltado do último tamoio entrincheirou a pátria contra os conquistadores aventureiros.

E assim, pouco a pouco, se foram reformando todos os seus hábitos singelos de aldeão português: e Jerônimo abrasileirou-se.

O Cortiço, pág. 79 (ed. Moderna)

A vida no cortiço transformará o comportamento de Jerônimo para sempre. Afinal, para o escritor naturalista, o comportamento humano não passa de reações incontroláveis à influência do meio em que se encontra cada um.

Nesse sentido, os seres humanos são aproximados cada vez mais dos animais – como fica evidente com o personagem Libório, do próximo post. Aguardem!

2 comentários em “Personagens: Jerônimo

  1. Balbo disse:

    Pow vllw men me ajudou muito…
    brigadão…

  2. pah disse:

    me ajudoo muitoo brigadão…

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