A epopeia do negro que resolveu ser livre

Minha leitura de Jubiabá está avançando muito rapidamente. O que é bem comum, quando se trata de Jorge Amado.

A cada página vai ficando clara para mim a intenção de fazer desta obra uma “epopeia do revolucionário brasileiro”. Algo como um Manifesto do Partido Comunista tupiniquim.

No centro da saga está Antônio Balduíno, um negro pobre, criativo, briguento e muito malandro. Sempre acompanhado pela sabedoria espiritual de Jubiabá, pai-de-santo centenário e ex-escravo, Antônio Balduíno decide muito jovem o que quer ser da vida: ele quer ser livre.

E aqui está a tese central de Jorge Amado, o jovem escritor comunista nos anos 1930, em Jubiabá. Seja antes ou depois da lei áurea, o negro brasileiro não era livre. Se antes estava acorrentado às senzalas, então estava às fábricas. Antes temia a chibata do capitão-do-mato, depois temeria o capataz da fábrica com suas advertências, multas, demissões.

Mas Antônio Balduíno, herói negro nascido no morro do Capa-Negro e que os ricos chamam de vagabundo, não quer esse destino para si. Quer ser livre, e vai conseguir ser livre.

A vida no morro do Capa-Negro era difícil e dura. Aqueles homens todos trabalhavam muito, alguns no cais, carregando e descarregando navios ou conduzindo malas de viajantes, outros em fábricas distantes e em ofícios pobres: sapateiro, alfaiate, barbeiro. Negras vendiam arroz-doce,  mungunzá, sarapatel, acarajé, nas ruas tortuosas da cidade, negras lavavam roupa, negras eram cozinheiras em casas brancas dos bairros chiques. Muitos dos garotos trabalhavam também. Eram engraxates, levavam recados, vendiam jornais. (…)

Já sabiam seu destino desde cedo: cresceriam e iriam para o cais onde ficariam curvos sob o peso de sacos cheios de cacau, ou ganhariam a vida nas fábricas enormes. E não se revoltavam porque desde há muitos anos vinha sendo assim: os meninos das ruas bonitas iam ser médicos, advogados, engenheiros, comerciantes, homens ricos. E eles iam ser criados destes homens. Coisa que o negrinho Antônio Balduíno aprendeu desde ceno no exemplo diário dos maiores. (…)

Raros eram os homens livres do morro: Jubiabá, Zé Camarão. Mas ambos eram perseguidos: um por ser macumbeiro, o outro por malandragem. Antônio Balduíno aprendeu muito nas histórias heroicas que contavam ao povo do morro e esqueceu a tradição de servir. Resolveu ser do número dos livres, dos que depois teriam abc e modinhas e serviriam de exemplo aos homens negros, brancos e mulatos, que se escravizavam sem remédio. Foi no morro do Capa-Negro que Antônio Balduíno resolveu lutar.

Jorge Amado, Jubiabá (Companhia das Letras, págs. 34-35)

Jubiabá: sinopse

“O velho macumbeiro e ex-escravo Jubiabá é a figura espiritual que paira sobre a acidentada trajetória do negro Antônio Balduíno, nascido órfão no morro do Capa-Negro, em Salvador, e que se torna sucessivamente menino de rua, malandro, sambista, lutador de boxe, trabalhador das plantações de fumo e estivador.”

 

 

Resolvi ler Jubiabá por sugestão da minha professora de Cultura Brasileira na faculdade, Juliana Serzedello. O tema da aula era “democracia racial” e nós discutíamos como é o racismo brasileiro – que muitos ainda insistem em negar a existência.

A leitura de Jubiabá, livro que Jorge Amado escreveu quando tinha apenas 23 anos, vem me levando de volta a uma época em que a linha que separava os brancos dos negros na sociedade brasileira era muito mais definida.

A história se passa em Salvador, que é chamada no livro de Bahia de todos-os-santos, no início do século XX. Época em que nasceu a primeira geração de negros que não conheceram a escravidão, mas em que a mentalidade escravista ainda sobrevivia com força – senão mais nas senzalas e pelourinhos, agora nos morros e nas fábricas.

Luta entre classes e luta entre raças. Logo nos primeiros capítulos de Jubiabá é possível perceber que a militância comunista de Jorge Amado – manifestada, com intensidade variada, em toda a obra do autor até o final de sua vida – é muito exacerbada nessa obra. Mas, em meio ao conflito entre patrões e trabalhadores, está aquela sensibilidade que só Jorge Amado tem sobre como funciona a sociedade brasileira: uma terra de mestiçagem, malandragem e exploração de gente por gente.

Neste ano do centenário de Jorge Amado, fiz uma reportagem em que entrevistei a antropóloga Ilana Goldstein, uma das maiores especialistas em Jorge Amado da USP. Foi uma verdadeira aula. Sempre que estou lendo, me lembro das coisas que ela me disse. Acompanhe.

Terminado o livro, vamos ao filme!

Finalmente acabei de ler Capitães da Areia. Mas não se deixem enganar: o tempão que eu demorei se deveu aos infinitos compromissos de alguém que está no último ano de faculdade (ô curso que não acaba nunca, ai meu Deus!!).

Já o livro é empolgante, divertido, comovente e revoltante – enfim, é do tipo que a gente lê em pouquíssimos dias. Recomendo muito, mesmo a quem não está prestando vestibular.

Agora, aproveitando a aguardadíssima folga do domingo, vou sair para assistir ao filme. Depois eu conto como foi!

‘Capitães da Areia’ recorre a não-atores e foge do sotaque de novela

Dirigido por neta de Jorge Amado, longa-metragem que chega ao circuito nacional neste fim de semana é, para Cecília Amado, uma “fábula contemporânea”

André Gomes

Cena do filme ‘Capitães da Areia’, baseado em romance de mesmo nome de Jorge Amado

A poucas horas da exibição em sessão de gala de Capitães da Areia no cine Odeon Petrobras, na noite desta sexta-feira, elenco, diretora e o músico Carlinhos Brown se reuniram para uma coletiva de apresentação do longa – um dos destaques do Festival do Rio. O filme também estreia em circuito nacional no fim de semana com com 120 cópias. Rodado com orçamento em torno de 9 milhões de reais, a produção deve se beneficiar do título de uma das obras mais conhecidas de Jorge Amado. Para isso, obviamente, contribui a assinatura de Cecília Amado, neta do escritor.

“O mais interessante para mim, como cineasta, é dialogar com o Brasil, que era o que meu avô fazia”, disse Cecília, que capta, graças a um elenco majoritariamente formado por não-atores, a atmosfera de uma Bahia legítima, sem falsos sotaques ou caracterizações ‘de novela’. Para Carlinhos Brown, um acerto: “Ficou estabelecido que na Bahia só se faz batucada e axé. Nada contra. Mas a Bahia é mais. É a de Jorge Amado, de Dorival Caymmi, de João Gilberto”, disse o músico, que investiu em trilha marcada pela percussão, mas com espaço também para temas românticos. “Encontramos em Cecília a oportunidade de recontar a Bahia como canção. Ela foi sensível de reconhecer que em mim e tantos outros baianos residem os capitães da areia”, continuou.

A diretora conta que o convívio com a garotada deu o tom do filme, no retrato de uma Bahia que há muito não se via no cinema, bem mais autêntica do que o habitual. Se temas atuais como o tráfico de drogas ficam de fora, por não representarem a realidade dos anos 30, o realismo se dá pela trajetória de cada um dos jovens selecionados para o elenco, muitos deles com histórias de sofrimento semelhantes às dos personagens. “Nosso filme é uma fábula contemporânea, moderna e jovem. Pop, sim, inspirada no cotidiano desses 1.200 jovens com os quais tivemos contato antes das filmagens”, analisou Cecília, lembrando que o candomblé faz parte da vida de 90% dos menores selecionados. “Há quem diga que os filmes adaptados de romances de Jorge são folclóricos, mas depende do olhar que se joga para eles. Boa parte da realidade retratada em Capitães da Areia ainda existe”, disse.

Do total de 1.200 adolescentes, 700 foram selecionados para improvisações, diminuídos em seguida para 90, que participaram de oficinas artísticas, até que se chegasse aos 12 que acabaram ganhando a chance de ouro de se ver nas telas de cinema. A ideia é que, mesmo terminados os períodos de filmagem e lançamento, a produção do filme, em parceria com as ONGs, dêem suporte às novas possibilidades que se abrem para os jovens artistas.

Fonte: Veja.com.br

Amanhã, livro novo. Aguardem!

Capitães da Areia: Personagens

Oi, pessoal! Estou super atolada de coisas para fazer: provas na faculdade, trabalhos, ensaios para minha peça no final do ano (ainda falarei mais dela)… é muita coisa!

Mas calma, não vou deixar meus queridos e mui fiéis leitores na mão por causa disso. Aí vai um belo resumo sobre cada personagem de Capitães da Areia, para você que vai prestar Vestibular no mês que vem.

Mas faço questão de dar a fonte: esse resumo é do Guia do Estudante, que aliás é um site ótimo, não deixe de conhecer!

Os capitães reunidos no trapiche

Capitães da Areia – Personagens

A obra não possui um personagem principal. Para indicar um protagonista, o mais apropriado seria apontar o conjunto do bando, ou seja, os Capitães da Areia como grupo. Isso porque as ações não giram em torno de um ou de outro personagem, mas ao redor de todos. Pedro Bala, o líder do bando, não é mais importante para o enredo do que o Sem-Pernas ou o Gato. Pode-se dizer que ele é o líder do bando, mas não lidera o eixo do romance. Daí a idéia de que o protagonista é o elemento coletivo, e cada membro do grupo funciona como uma parte da personalidade, uma faceta desse organismo maior que forma os Capitães da Areia. 

PEDRO BALA – líder dos Capitães da Areia, tem o cabelo loiro e uma cicatriz de navalha no rosto, fruto da luta em que venceu o antigo comandante do bando. Seu pai, conhecido como Loiro, era estivador e liderara uma greve no porto, onde foi assassinado por policiais. 

SEM-PERNAS – deficiente físico, possui uma perna coxa. Preso e humilhado por policiais bêbados, que o obrigaram a correr em volta de uma mesa na delegacia até cair extenuado, Sem-Pernas conserva as marcas psicológicas desse episódio, que provocou nele um ódio irrefreável contra tudo e todos, incluindo os próprios integrantes do bando. 

GATO – é o galã dos Capitães da Areia. Bem-vestido, domina a arte da jogatina, trapaceando, com seu baralho marcado, todos os que se aventuram numa partida contra ele. Além dos furtos e do jogo, Gato consegue dinheiro como cafetão de uma prostituta chamada Dalva. 

PROFESSOR – intelectual do grupo, deu início às leituras depois de um assalto em que roubara alguns livros. Além de entreter os garotos, narrando as aventuras que lê, o Professor ajuda decisivamente Pedro Bala, aconselhando- o no planejamento dos assaltos. 

PIRULITO – era o mais cruel do bando, até que, tocado pelos ensinamentos do padre José Pedro, converte-se à religião. Executa, com os demais, os roubos necessários à sobrevivência, sem jamais deixar de praticar a oração e sua fé em Deus. 

BOA-VIDA – o apelido traduz seu caráter indolente e sossegado. Contenta-se com pequenos furtos, o suficiente para contribuir para o bem-estar do grupo, e com algumas mulheres que não interessam mais ao Gato. 

JOÃO GRANDE – é respeitado pelo grupo em virtude de sua coragem e da grande estatura. Ajuda e protege os novatos do bando contra atos tiranos praticados pelos mais velhos. 

VOLTA SECA – admirador do cangaceiro Lampião, a quem chama de padrinho, sonha um dia participar de seu bando. 

DORA – seus pais morreram, vítimas da varíola, quando tinha apenas 13 anos. É encontrada com seu irmão mais novo, Zé Fuinha, pelo Professor e por João Grande. Ao chegar ao trapiche abandonado, onde os garotos dormem, Dora quase é violentada, mas, tendo sido protegida por João Grande, o grupo a aceita, primeiro como a mãe de que todos careciam, depois como a valente mulher de Pedro Bala. 

PADRE JOSÉ PEDRO – padre de origem humilde, só conseguiu entrar para o seminário por ter sido apadrinhado pelo dono do estabelecimento onde era operário. Discriminado por não possuir a cultura nem a erudição dos colegas, demonstra uma crença religiosa sincera. Por isso, assume a missão de levar conforto espiritual às crianças abandonadas da cidade, das quais os Capitães da Areia são o grande expoente. 

QUERIDO-DE-DEUS – grande capoeirista da Bahia, respeita o grupo liderado por Pedro Bala e é respeitado por ele. Ensina sua arte para alguns deles e exerce grande influência sobre os garotos.