Livros que você TEM que ler antes de morrer (parte 3): O Físico

Título original: The Physician
Autor: Noah Gordon
Ano: 1986
 

Uma grande saga medieval. Um dos melhores romances históricos que eu já li.

Conta a história do menino Rob J. Cole, nascido na Inglaterra no século XI. Quando seus pais morrem, Rob é adotado pelo cirugião-barbeiro da região, que na Idade Média era uma mistura de farmacêutico com curandeiro. A medicina era proibida pela Igreja católica na época, pois era considerada uma arte pagã.

Em pouco tempo na companhia de seu novo mestre, Rob J. descobre que possui o dom de perceber a morte se aproximando de um paciente apenas ao tocar suas mãos. Mas, apesar desse estranho dom, ele se revela um barbeiro dedicado e capaz de aplacar o sofimento das pessoas. Rapidamente, Rob aprende tudo o que o barbeiro sabe sobre medicina e curandeirismo, o que é na verdade é bem pouco.

Quando morre seu tutor, Rob segue sozinho na profissão. Mas quando, por acaso, conhece um judeu que estudou medicina na Pérsia, percebe que há um universo inteiro de conhecimentos novos sendo descobertos nas universidades do Oriente, conhecimentos que, estupidamente, são vetados aos cristãos.

Depois disso, num momento de extrema coragem, resolve deixar tudo para trás e, disfarçado de judeu, viajar para a Pérsia para estudar ao lado de um dos mais importantes médicos da Idade Média: Avicenna (Ibn Sina).

Livros que você TEM que ler antes de morrer (parte 2)

Tílulo: Venha ver o pôr-do-sol e outros contos (coletânia)
Autora: Lygia Fagundes Telles
Ano de publicação: 1987 
 

Lembro-me como se fosse ontem: numa sonolenta manhã de 2003, a nossa rígida porém divertida professora de Redação na oitava série, que atendia pelo nome de Cândida, nos informou que este livrinho seria a leitura do bimestre.

A professora Cândida era tão temida, e ao mesmo tempo, tão admirada pelos alunos, que ninguém sentia vontade de fazer aquela piadinha óbvia sobre a ligação entre o nome dela e a famosa água sanitária (embora todos fizessem a piada em pensamento).

Minha primeira impressão ao ver a capa do livro foi de desânimo, pois estava na cara de que era um livrinho de crianças. E eu com certeza me sentia muito adulta, no alto dos meus treze anos.

Mas a professora Cândida sabia que nós não éramos mais criancinhas, e jamais nos obrigaria a ler histórias idiotas e fáceis, só para responder a perguntinhas estúpidas no final do bimestre. Aquilo simplesmente não era o perfil da professora Cândida.

Ela queria era nos despertar o prazer da leitura, através dos contos de uma das melhores escritoras brasileiras do século XX. Bom, essa era a minha teoria; outros alunos achavam que o objetivo dela era só nos mandar fazer um conto por nossa própria conta depois, para se divertir esculhambando diante da turma as histórias menos criativas.

Seja lá qual fosse o propósito dela, eu nunca mais me esqueci de Venha ver o pôr-do-sol. Comprei outros livros da Lygia, contos e romances, assisti a palestras dela na faculdade, pedi autógrafos. Até hoje ela é das minhas autoras preferidas. Por isso quero compartilhar com vocês um dos melhores contos que já li na vida. Aproveitem.

Biruta

Lygia Fagundes Telles

Alonso foi para o quintal carregando uma bacia cheia de louça suja. Andava cm dificuldade, tentando equilibrar a bacia que era demasiado pesada para seus bracinhos finos.

  – Biruta, eh, Biruta! – chamou sem se voltar.

O cachorro saiu de dentro da garagem. Era pequenino e branco, uma orelha em pé e a outra completamente caída.

  – Sente-se aí, Biruta, que vamos ter uma conversinha – disse Alonso pousando a bacia ao lado do tanque. Ajoelhou-se, arregaçou as mangas da camisa e começou a lavar os pratos.

  Biruta sentou-se muito atento, inclinando interrogativamente a cabeça ora para a direita, ora para a esquerda, como se quisesse apreender melhor as palavras do seu dono. A orelha caída ergueu-se um pouco, enquanto a outra empinou, aguda e ereta. Entre elas, formaram-se dois vincos, próprios de uma testa franzida do esforço de meditação.

Continue.

Livros que você TEM que ler antes de morrer (parte 1)

Título: Dois Irmãos
Autor: Milton Hatoum (clique aqui para conhecer o site oficial dele)
Ano de publicação: 2000 (Brasil)
 

Dois irmãos foi um dos melhores livros que eu li no ano passado, para um trabalho na faculdade. Conta a história dos irmãos gêmeos Yaqub e Omar, desde a infância até a vida adulta.  As diferenças da criação dos dois, apimentada por gênios totalmente incompatíveis, resultam numa trajetória de ódio e ressentimento, que encontra seu auge durante a ditadura militar.

Qualquer semelhança com os gêmeos Pedro e Paulo, de Machado de Assis, não é mera coincidência. Ambas as obras buscaram inspiração na lenda bíblica de Esaú e Jacó.

O que mais me marcou em Dois irmãos foi a sensibilidade para retratar um drama familiar tão comum, e ao mesmo tempo tão terrível, como uma briga entre irmãos. Como não identificar nas nossas próprias famílias histórias de ressentimento como a vivida por Yaqub e Omar, irmãos criados com amor para serem amigos?

Como toda obra de Milton Hatoum, a trama de Dois irmãos é ambientada em Manaus, capital do Amazonas. Preciso registrar aqui a vergonha que senti durante a leitura, conforme ia percebendo que tenho mais conhecimentos sobre a vida em Londres ou em Nova York do que na Amazônia. Quando Hatoum descrevia a efervescência de Manaus, a pulsação do porto, as belezas naturais, eu me sentia como uma gringa do meu próprio país.

É pena que nós, que somos do Sudeste, às vezes assumimos uma postura tão arrogante com relação aos outros estados do Brasil. Nos interessamos mais pelo que vem de fora. Torcemos o nariz para nossa própria literatura, música, arte.

Nossa desconfiança (estou aqui me incluindo nisso) só aumenta o mérito de Milton Hatoum, escritor nascido em Manaus, por vencer o preconceito de seus próprios compatriotas, e assim conquistar inúmeros prêmios. Aos 59 anos, Hatoum está em plena atividade literária. Seu último trabalho, o livro de contos A cidade ilhada, foi publicado em 2009.

Só espero que ele continue nos presentando com novas histórias sobre a amazônia, e as pessoas que vivem, amam e sofrem nela.